terça-feira

Cumplicidade

No artigo publicado em 19 de julho no Jornal Zero Hora, sob o título Cumplicidade, o genial escritor Luis Fernando Veríssimo sentencia: “A companhia do que há de mais preconceituoso e reacionário no país inibe qualquer crítica ao Lula, mesmo as que ele merece.” A tese, como sempre muito bem argumentada, é concluída com uma advertência: “antes de entrar num coro, olhe em volta.”

Como grande admirador do Veríssimo, antes de continuar criticando o presidente, procurei analisar o coro dos descontentes à minha volta e, de fato, vi um bando de reacionários e preconceituosos puxando a vaia. Vi também a tal “elite branca e racista que controla a mídia”, delatada insistentemente pelo Paulo Henrique Amorim em sua Conversa Afiada. Vi fascistas, nacional-socialistas e até coisas piores, incitando o caos e o golpe.

São fantasmas conhecidos de muito tempo, já não me assustam mais. Aí fui olhar em volta de Lula. Maquiavel diz que “a primeira impressão que se tem de um governante e seu cérebro vem de ver os homens que ele tem em volta de si.” Em torno do presidente, vi espectros igualmente medonhos, conservadores, intolerantes e nazi-fascistas, racistas da elite branca e de todas as cores e matizes, o pior da política e do fisiologismo.

No centro deste empate, a imagem mítica de “um presidente pobre, nordestino e de esquerda”, pareceu-me a nítida construção de um sofisticado embuste. Até porque, muito pouca gente sabe ao certo quanto Lula ganhava antes de se encastelar no poder, mas, sem dúvida, já não era mais “pobre”. Quanto ao currículo “nordestino e de esquerda”, prefiro Heloísa Helena. Aquela que o PT expulsou porque era uma pedra no sapato, e que ainda continua uma rocha.

É junto com a destemida senadora (sem mandato oficial e, no entanto, legítimo, e também de origem modesta) do PSOL, com Jefferson Peres do PDT, com Pedro Simon do PMDB, Fernando Gabeira do PV e outros tantos políticos que resistem à bandalheira e ao cinismo, que prefiro estar. Em meio ao coro dos que continuam a lutar, mesmo nas trincheiras de partidos cooptados pela situação, dos que acreditam ser possível estar no meio dos vermes e não se contaminar e que, somente sem temer o contágio, a democracia brasileira pode amadurecer.

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